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Ìyálórìsà responsável pelo Ilê Ìyába Àse Òsun Doko, de Nação Ijexá, localizado na cidade de Gravataí-RS; filha de Pai Pedro de Oxum Docô. Contatos fone:(51) 9114-2964 ou e-mail fernanda__paixao@hotmail.com

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012


Sempre é tempo de melhorar, crescer, evoluir, concluir projetos e ousar ir mais além... 

E um pouco mais ainda! 

O hoje é o resultado do que plantamos ontem.

Pra amanhã ser diferente, hoje temos que plantar diferente.

E cada instante é novinho em folha! 

Sempre podemos mudar... 

Basta estar disposto a percorrer o caminho necessário, pagar o preço pelas escolhas e assumir a responsabilidade pela própria vida!

O tempo é implacável, passa mesmo, pra todos!!! 

Como vamos utilizá-lo é o que realmente 
FAZ A DIFERENÇA!

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Os Orixás adquirem seus poderes


Numerosos Òrìsà estavam vivendo na Terra recém-criada por Olórun, mas ainda sem terem todos os poderes pelos quais são conhecidos atualmente. Sempre que havia necessidade de o povo fazer coisas importantes e com segurança, rogavam a Olórun ou a Òrúnmìlà, E isso estava desagradando aos Òrìsà.

Certo dia, Òrìsà Oko, conversando com Òsóòsì, disse: "Aqui estamos morando entre os seres humanos. Somos distinguidos? Se o povo necessita de alguma coisa, vai pedir a Òrúnmìlá. Se tivéssemos o conhecimento de algum poder, o povo não iria importunar constantemente Òrúnmìlà." Dizendo isso, resolveu ir falar diretamente com Òrúnmìlà:

"Eu não tenho poderes que me fazem sobressair entre os seres humanos criados por Obàtálá. Você, Òrúnmìlà, que tem acesso direto a Olórun, poderia dotar-me de algum atributo especial. Assim, o povo da Terra viria a mim rogar por socorro em seus momentos de aflição." Òrúnmìlà ouviu atentamente o pedido feito e disse: "Sim, talvez tenha razão nisto. Vou analisar o assunto." Òrìsà Oko partiu e Òrúnmìlà seguiu seu caminho.

Mais adiante encontrou Ògún, que lhe perguntou: "Eu não sou um Òrìsà? Também devo ter poderes. Todas as vezes que alguma coisa importante é pedida pelo povo, este vem procurá-lo. É Òrúnmìlà isso, Òrúnmìlà aquilo. Dê-me um conhecimento especial, de modo que eu possa fazer algo para manter o mundo funcionando." Òrúnmìlà respondeu: "Sim, tenho estado pensando acerca disto. Verei o que posso fazer."

E, assim, seguiu seu caminho, encontrando outros Òrìsà. Èsù, que já tinha conhecimento da linguagem, foi até Òrúnmìlà buscar mais conhecimentos. Sàngó também o procurou; Òsányín foi até ele e, depois deles, outros mais também, todos perguntando e pedindo um poder especial. 
Òrúnmìlà estava angustiado. Pensou: "Tenho por todos os Òrìsà a mesma afeição. Se eu der alguma coisa para um deles, os outros certamente irão queixar-se. Tenho muitos poderes para serem divididos. Para quem eu deveria dar este ou aquele poder?" Por causa do assunto surgido, Òrúnmìlà tornou-se arredio, não tocava em nenhum alimento e mal conseguia dormir à noite. 

Os dias foram se seguindo e Òrúnmìlà tomava rumo pelos campos, pensativo e analisando a questão de como poderia dividir os poderes entre os Òrìsà sem criar problemas entre eles. E estava pensando nisso quando encontrou Agemo, o camaleão. "Você, Òrúnmìlà, o porta-voz de Olórun sobre a Terra, por que está tão deprimido?" Òrúnmìlà respondeu: "Um por um, os Òrìsà vêm até mim pedir para que eu lhes dê um poder especial, de modo que eu possa aliviar o meu trabalho neste sentido. De fato, estou sobrecarregado de atendimentos e isto seria para mim uma forma de suavizar o meu trabalho. Mas existem tantos poderes, alguns grandes, outros pequenos. Se eu der alguma coisa grande para um, os outros ficarão magoados. Quero tratar todos os Òrìsà com igualdade. Como posso fazer isso de maneira que haja harmonia em vez de discórdia?"

Ouvindo tudo, por algum momento, Agemo pensou e disse: "Talvez seja melhor deixar a distribuição dos poderes à sorte. Volte para o Òrun e depois envie uma mensagem para anunciar que, num determinado dia, você derramará os poderes sobre a Terra. Deixe cada Òrìsà agarrar o que puder. Qualquer poder que um Òrìsà pegar desta forma será dele, então." E concluiu: "Enviando a mensagem você terá dado a notícia, e nenhum Òrìsà poderá dizer que Òrúnmìlà o abandonou."

Diante do que ouviu, Òrúnmìlà relaxou da tensão a que estava sendo submetido, por perceber sabedoria naquelas palavras, assim como a solução para as suas dúvidas. Então, disse: "Agemo, embora você seja pequeno, seu nome será grande. Farei exatamente o que me diz." Em seguida, retornou ao Òrun a fim de preparar a distribuição dos poderes. E enviou a seguinte mensagem na direção da morada de cada Òrìsà: "No quinto dia após este, vocês deverão se dirigir ao campo livre de Ilé Ifè. Os poderes serão espalhados do alto e todos deverão agarrar o que puderem. Dessa forma, tudo irá depender de cada um." Todos os Òrìsà concordaram, agradecidos, enaltecendo a sabedoria de Òrúnmìlà na distribuição dos poderes. 

No quinto dia os Òrìsà seguiram para o local determinado e aguardaram. Do alto começaram a surgir sons estranhos acompanhados pelo movimento agitado da brisa que pairava sobre todos. Foi nesse instante que os poderes começaram a cair do Òrun. E todos começaram a correr para aqui e acolá com as mãos estendidas. Enquanto um agarrava um poder, outro pegava o que podia. Alguns poderes escapavam de suas mãos e caíam na relva ou sobre as árvores. 

A correria era grande, com os Òrìsà procurando em todas as direções. Uns eram mais rápidos que outros.  Os mais ágeis e enérgicos conseguiram pegar maior número de poderes. Mas todos receberam alguma coisa.


Èsù foi dos mais persistentes, e não exitou em empurrar quem estivesse por perto; por causa disso pegou grande parte dos poderes, entre eles o de ser guardião do Àse de Olódùmarè e o transportador das oferendas votivas. Em face disso, os Òrìsà e os seres humanos, dali em diante, passaram a tratá-lo com respeito especial e procuraram evitar tornar-se seu inimigo. 

Sàngó, através do que conseguiu apanhar, tornou-se o dono da pedra, do relâmpago, adquirindo o título de Jàkúta, o arremessador de pedras. Mais tarde, quando assumiu o reino de Òyó, veio a ser denominado Oba Jàkúta.

Sànpònná veio a ser o senhor das doenças, em especial a varíola; Òsányin adquiriu o conhecimento do uso litúrgico e medicinal das plantas; Òrìsà Oko tornou-se o senhor da fartura das colheitas; Ògún ficou com o poder do uso dos metais. 

Assim, cada Òrìsà recebeu a sua parte dos poderes do Òrun, como forma de beneficiar os seres humanos através de pedidos e invocações.

CONCLUSÃO:
A busca de poderes pelos Òrìsà lembra que todos os seres são portadores de poderes e que todos esses poderes são dados pelo Ser Supremo. Não se admite a passividade com o intuito de aguardar que o sucesso e as coisas boas da vida caiam nas mãos sem esforço algum. É preciso operar nesse sentido, com ações que objetivem despertar todos os poderes existentes no ser humano.

NOTA:
Òrìsà Oko: divindade tutelar da agricultura e da fertilidade da terra.

(Extraído do livro "Mitos Yorubás: O Outro Lado do Conhecimento" de José Beniste, com adaptações)

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

O que são as quartinhas de barro e para que servem?



As denominadas "quartinhas de barro" estão presentes em todo o culto africano, nas mais diversas formas em que este se apresenta e acompanham todos os assentamentos de Òrìsà.

Devem ser feitas de barro natural (amò) e em seu interior é colocada água (omi). A água colocada em seu interior transpira e evapora, necessitando assim de um abastecimento constante.

As águas (omi), e o barro primordial (amò), são os elementos utilizados por Òsàlá para moldar o ser humano, para que, após fisicamente moldado, Olódùmarè lhe insufle o Emí, princípio vital representado pela respiração, gerando assim a vida.

As quartinhas então representam vida e criação, elementos sem os quais não existe Òrìsà, tampouco àse.

Sua natureza sempre mutável, precisando constantemente de abastecimento, nos lembra que a vida sempre está em movimento, sendo necessária a renovação contínua e periódica do àse (energia dinâmica em movimento), tanto individual quanto coletivo, princípio este que permeia todo o culto a Òrìsà.

Nota: Essa tarefa de esculpir a figura física dos seres humanos faz Òsàlá ser chamado de Alámò Rere, o perfeito escultor, embora alguns sejam produzidos com deficiência física.

sexta-feira, 23 de março de 2012

O que ética e moral têm a ver com culto a Òrìsà?

Òsàlá representa a idéia de pureza ética, conforme seu nome primordial o define - Obàtálá - Oba ti àlà, o rei cuja roupa é branca, ou Oba ti olá, o rei que possui honra. A palavra Àlà é entendida não apenas como um tecido da cor branca, mas sim como algo puro, sem mácula. Quando se canta “Nwon ò ni’ta epo si àlà re o” está se querendo dizer, nenhum óleo de palmeira deve respingar em sua roupa branca, numa alusão à reputação de uma pessoa que deve ser sempre boa e imaculada. Òsàlá nos mostra sua preferência por tudo que é branco, sinônimo de pureza e retidão ética, e nos lembra da necessidade de nos depurarmos e purificarmos. 


Os que sugerem que religião não tem necessariamente uma conexão com moralidade, e acham que tudo deve ser resolvido com Ebo ou outras obrigações, revelam falta de conhecimento, ou mesmo de interesse em saber discernir as coisas, em conhecer o culto a Òsàlá em toda a sua essência. A ética revelada através de seus exemplos, nas histórias e mitos, demonstra uma dignidade e caráter como modelo de comportamento a ser seguido.


Òsàlá é uma das raras divindades que as histórias revelam como possuidor de apenas uma mulher, chamada de Yemòwo (vários autores confundem Yemòwo com Nàná). Isto torna o fato bem interessante, em razão de ser tradição entre as famílias yorubás o senhor da casa - Onílé -  ser possuidor de várias mulheres. 


Conta-se que certa vez trouxeram a Òsàlá a notícia de que o mundo estava indo muito mal. Ninguém estava mais se entendendo, o trabalho não prosperava e havia infelicidade geral. Procurando saber o que estava acontecendo, Òsàlá descobriu que a causa de tudo era o falatório e as brigas das diversas mulheres dos homens. Então ele disse:


“A ò lé gbé aarin ògójì enìa k’éni ó má sì wí. Òrìsàálá ri on’igba aiya n’lèk’ó too f’owó mu Yemòwo nìkan; ò lè gbe aiye Olù’fè k’órùn k’aiya jékióná gún.”


“É totalmente impossível viver no meio de quarenta pessoas (mulheres) e não dizer coisas erradas. Òsàlá vê a possibilidade de casar com duzentas mulheres, mas ainda assim une-se apenas a Yemòwo; aquele que tem a responsabilidade cívica de Ifè não pode esperar ter êxito se tiver, ao mesmo tempo, que lidar com uma porção de mulheres.”


A moralidade é basicamente fruto da religião. O conceito de Deus para o homem tem tudo a ver com o que é feito para dar normas à moralidade. Deus não é apenas o criador de todas as coisas, como também o juiz de todos e o encaminhador para os diversos planos do Òrun. O trabalho e as pessoas de cada divindade, as ações humanas e ofensas rituais estão sob inspeção regular; de tempos em tempos, relatos são feitos a Ele. Para este fim, Èsù é designado para inspeção geral da conduta de todos. Èsù é a efetiva regra do universo, o princípio dinâmico e fiscal de Olódùmarè. 


A ética está exemplificada no comportamento de Òsàlá e nos relatos dos Odù, de raro acesso aos praticantes dos cultos afro-brasileiros aqui do Sul do Brasil. Em todos eles, encontramos a lei moral, com suas regras e determinações de conduta, que podemos relacionar a fim de serem devidamente aplicadas.


Ìwà, o caráter, é o mais importante de todos os valores morais e o maior atributo do homem. A palavra é formada pelo verbo Wà, ser, haver, existir, e a vogal I. Ìwà Pèlè é uma pessoa de bom caráter que não entra em choque com nenhuma força humana ou sobrenatural, vivendo em completa harmonia com todas as forças que governam o mundo. Esse fato é o que pesa no julgamento divino e define o bem-estar na Terra e o seu lugar futuro no pós-vida. A expressão abaixo define o seu conceito com a religião:


“Ìwà lèsin.” O caráter é a religião.


Oore, a bondade, é considerada uma grande virtude, quando envolve generosidade e hospitalidade. Se rere, fazer o bem, é a tarefa das grandes realizações diárias.


Sùúru, a paciência, é entendida como o fator mais importante para se evitar precipitações que impliquem a perda de caráter. A paciência é o primeiro filho de Olódùmarè e o pai de Ìwà, o caráter.


Òwò, o respeito a que todos se devem entre si, sobretudo aos mais velhos pela sua antiguidade e à experiência admirável de vida.


Outras virtudes: Olóòtóo, uma pessoa verdadeira é virtude essencial numa comunidade; Olóòdodo, ser justo e honesto; e Sé ìféni, fazer a caridade.


A pessoa que segue os preceitos e caminhos dos Òrìsàs, vivencia seu culto, deveria, também, vivenciar esses valores éticos e morais em suas vidas cotidianas, para assim fortalecer em si e ser um agente possuidor e multiplicador do àse. Sempre que praticamos atos que atentam contra nosso caráter, maculamos nossa espiritualidade, nossa força vital, nosso àse pessoal e nossa orixalidade.  



Bibliografia consultada: Livro "As Águas de Oxalá: Àwon Omi Òsàlá", de José Beniste. 

MORTE, ANCESTRAIS E ANTEPASSADOS NA CONCEPÇÃO YORUBÁ

Os yorubá, como os demais grupos africanos, crêem na existência ativa dos antepassados. A morte não representa simplesmente um fim da vida humana, mas a vida terrestre se prolonga em direção à vida além-túmulo, exatamente em algum dos nove espaços do òrun, o domínio dos seres desprovidos do èmí (representado pela respiração, é a força vital que o corpo humano recebe de Olódùmarè. Quando uma pessoa morre, diz-se: Èmí rè ti lo - “Seu èmí foi embora”). Assim a morte não representa uma extinção, mas mudança de uma vida para outra. 


Os antepassados ou ancestrais são denominados Òkú òrun e Àgbagbà (Òkú: morto, cadáver). Um antepassado é alguém de quem uma pessoa descende, seja através do pai ou da mãe, em qualquer período do tempo, e que o ser vivente conserva relações filiais afetuosas. Somente alcançarão a condição de Ancestral com merecimento de culto aqueles que atingiram uma idade avançada, com uma vida de boa qualidade e trabalho expressivo para a sociedade, além de terem deixado bons filhos. Para os yorubá, um casamento sem filho é algo mal sucedido. Na verdade, seu sistema de valores tem por base três coisas: Owó (dinheiro), Omo (filhos), e Àíkú (vida longa). A vida longa é considerada a mais importante porque proporciona a oportunidade que pode tornar possível as duas outras.


São esses e toda a linhagem de gerações passadas que, depois da morte, se transformam, para seus familiares, nas figuras mais importantes do mundo espiritual. Embora os ancestrais compreendam membros masculinos e femininos das gerações anteriores, para o yorubá os ancestrais masculinos são os mais importantes.


Ao seguirem para o òrun, os ancestrais são libertos de todas as restrições impostas pela Terra; dessa forma, adquirem potencialidades que podem ser usadas para beneficiar seus familiares, que ainda estão na Terra. Por essa razão, é necessário mantê-los num estado de paz e contentamento. 


Quando dizemos que existe um culto ao ancestral, queremos dizer que o que existe de fato é uma manifestação de relacionamento familiar indestrutível entre o familiar que partiu e seus descendentes que aqui ficaram. A palavra culto então colocada tem o significado de homenagem.


O encaminhamento do espírito, depois dos rituais realizados, corresponde a passar de volta pelo portão do Oníbodè (o guardião da entrada na fronteira entre o òrun e o àiyé) em direção a Olódùmarè, para receber o julgamento de seus atos na Terra. De acordo com o òrun ao qual foi destinado, continuará a exercer suas funções familiares, agora de modo mais poderoso sobre seus descendentes que a ele continuam a se referir como Bàbá mi (meu pai) ou Ìyá mi (minha mãe).


Ikú, a morte, é visto como um agente criado por Olódùmarè para remover as pessoas cujo tempo na terra tenha terminado. A morte, denominada Ikú, e trata-se de um personagem masculino. Sua lógica é para as pessoas mais velhas, e que, dadas certas condições, devem viver até uma idade avançada. Por isso, quando uma pessoa jovem morre, o fato é considerado tragédia; por outro lado, a morte de uma pessoa idosa é ocasião para se alegrar. Costuma-se dizer: Ikú ki pa ni, ayò l’o npa ni (a morte não mata, são os excessos que matam).  


Embora a morte seja inevitável, e imprevisível, ela pode sofrer alterações através da intervenção de Òrúnmìlà ou de qualquer outro òrìsà junto a Olódùmarè. Isto reflete a necessidade de um constante acompanhamento da situação de uma pessoa através do jogo. Daí o provérbio: Arùn l’a wò, a ki wo Ikú (A doença pode ser curada, a morte não pode ser remediada).


Ikú está relacionado com a terra e sua missão é a de restituir à terra o que lhe pertence, conforme o mito trazido por Juana Elbein dos Santos no livro “Os Nagô e a Morte”, pág. 107:


“Quando Olórun procurava matéria apropriada para criar o ser humano, todos os ebora partiram em busca da tal matéria. Trouxeram diferentes coisas, mas nenhuma delas era adequada. Eles foram buscar lama, mas ela chorou e derramou lágrimas. Nenhum ebora quis tomar da menor parcela. Mas Ikú apareceu, apanhou um pouco de lama e não teve misericórdia de seu pranto. Levou-o a Olódùmarè, que pediu a Òrìsàlá e a Olúgama que o modelaram e foi Ele mesmo quem lhe insuflou seu hálito. Mas Olódùmarè determinou a Ikú que, por ter sido ele a apanhar a porção de lama, deveria recolocá-la em seu lugar a qualquer momento, e é por isso que Ikú sempre nos leva de volta para a lama.”


Sendo assim, Ikú é um agente primordial que torna possível o ciclo: nascimento - vida - morte - renascimento (ìbí - ìyè - ìkú - àtúnwá). 




Fontes: livros "Òrún Àiyé- O Encontro de Dois Mundos" de José Beniste, e "Os Nagô e a Morte" de Juana Elbein dos Santos.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A RELIGIÃO QUE EU ACREDITO


"A Religião que eu acredito é aquela construída por todos, no dia-a-dia, com sacrifício, suor,  respeito, 
entrega, fé e amor ao Òrìsà...

A Religião que eu acredito abomina a feitiçaria, o topa tudo por dinheiro, 
o materialismo desenfreado...

A Religião que eu acredito tem no Òrìsà o início, o fim e o meio, último e único recurso...

A Religião que eu acredito é a das velhas e 
negras senhoras, de fé inabalável 
e sabedoria que brota das raízes...

A Religião que eu acredito adora árvores como deuses, e tem na vida seu bem supremo...

A Religião que eu acredito é aquela onde a vestimenta não suplanta valores e onde não 
se substitui a forma pelo conteúdo...

A Religião que eu acredito resistiu a escravidão, 
ao porrete da polícia, a marginalização e
 demonização sempre lhe imputada...

A Religião que eu acredito não é um modismo, 
um suvenir, algo descartável que 
jogamos fora quando não nos serve mais...

A Religião que eu acredito não é um show de 
estética extravagante, circo dos incaltos, 
mas um ritual de celebração a vida... 

A Religião que eu acredito é uma experiência 
vivida de amor pleno, fé e respeito aos Òrìsà, 
dentro e fora de nós...."

Fonte: http://iyalorisaelainetiosun.blogspot.com
Com alterações e adaptações.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Como surgiu a consulta a Ifá



Este mito fala sobre o retorno de Òrúnmìlà para o òrun, ficando os ikin¹ como seus representantes na Terra. Tem início num determinado tempo, quando Òrúnmìlà ainda não possuía filhos e seus oponentes o recriminavam: “Bàbá ò ní bi omo ni Ifè.” [“O pai que não tem filhos em Ifè.”]. Mas estavam enganados, pois mais tarde ele veio a ter oito filhos que se tornariam reis em várias cidades yorubás.


O primeiro filho foi denominado Alárá, o rei da cidade de Ará; o segundo foi Ajerò, rei de Ìjerò; o terceiro, Olóyémoyin, rei da cidade de Oyé; o quarto, Alákegi; o quinto, Óntangi-òlélé, rei de Ìtagi; Eléjèmòpé, de Ìjèlú; Owaràngún-àga, título de sacerdotes de Ifá; e Olówó, rei de Òwò.


Òrúnmìlà sentiu-se realizado, e, por ocasião de uma grande solenidade, quando celebrava um ritual, mandou chamar seus filhos. Atendendo ao chamado, todos prestaram obediência ao pai, saudando-o com a expressão “Àborúboyè bo síse.” [“Que os rituais sejam abençoados e aceitos" ou "Que o sacrifício seja abençoado e aceito.”]. Apenas Olówó se recusou a saudar Òrúnmìlà. Além disso, ele estava todo vestido de forma idêntica ao pai, o que significava uma afronta e desrespeito à autoridade paterna. 


Òrúnmìlà exigiu que ele dissesse as mesmas palavras dos irmãos, mas ele se recusou, permanecendo de pé e dizendo:
Òrúnmìlà, você se veste com a roupa òdùn², eu me visto com a mesma roupa; você empunha o òsùn³ feito de bronze, também tenho o meu cajado de bronze; suas sandálias são de bronze, as minhas também são; você usa uma coroa, e eu também. Assim, uma cabeça coroada não se curva para outra cabeça coroada.”


Diante do que estava vendo - uma total afronta à sua autoridade-, Òrúnmìlà se enfureceu e arrancou o òsùn das mãos de Olówó, o que significava cassação de sua autoridade. Mas não ficou apenas nisso. O fato levou Òrúnmìlà a se retirar do plano terrestre e retornar ao òrun. O resultado foi a fome, a peste, as doenças, a esterilidade, pois Òrúnmìlà representava o princípio da ordem, da sabedoria, da fertilidade. Sua partida levou a Terra a um colapso, ameaçando a extinção humana.


Os habitantes da Terra se viram clamando pela sua volta. Os rios secaram, os doentes continuaram enfermos, as espigas de milho brotavam mas não amadureciam. Sacrifícios foram feitos, mas sem resultado algum. 


Pediram que os filhos intercedessem pelo seu retorno a fim de restaurar a ordem das coisas.


Diante disso, os filhos foram até o òrun para pedir que o pai voltasse. Rogaram e recitaram preces de louvores. Mas o pai, mesmo com a decisão já tomada, ordenou-lhes que estendessem as mãos para a frente e deu-lhes os 16 ikin, os coquinhos sagrados de Ifá, dizendo-lhes: “Quando chegarem em casa, se desejarem possuir dinheiro, serão esses ikin que deverão consultar; se desejarem esposas e filhos, serão esses ikin que deverão consultar.”


Fazendo um determinado ritual, Òrúnmìlà reassumiu sua autoridade, colocando-se como a ligação entre o òrun e o àiyé. Deixou de herança aos seus filhos e discípulos o sistema oracular que permite invocá-lo em todos os momentos necessários.

NOTAS:
  1. Ikin: Coquinhos da palmeira do dendezeiro.
  2.  Òdùn: Um tipo de traje yorubá com detalhes feitos em palha-da-costa.
  3. Òsùn: Um bastão sagrado utilizado apenas pelos Bàbáláwo, símbolo de uma divindade conhecida pelo mesmo nome. É usado como um cajado e sempre posicionado ereto e colocado de pé apoiado numa parede.
Fonte:  Livro "Mitos Yorubás: O Outro Lado do Conhecimento", de José Beniste